São Paulo 450 Anos
Poética da Urbanidade - Estudos interculturais
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Materiais para as discussões do Colóquio Internacional de Estudos
Interculturais (2004)
PRAGA-SÃO PAULO NO PROGRAMA DE ESTUDOS INTERCULTURAIS "POÉTICA DA URBANIDADE" PELOS 450 ANOS DE SÃO PAULO
DIÁLOGO COM A SUBSTÂNCIA HISTÓRICA E A POÉTICA DA ATIVAÇÃO DA
MATÉRIA
Praga, 9 e 10 de agosto de 2003
Súmula
As reflexões relativas ao contextualismo de cunho historicista
e ao problema da avaliação adequada de concepções estéticas do
passado levantam a necessidade de um constante diálogo entre a
substância arquitetônica e urbanística legada pela história e
as propostas não-historicistas do presente. Essa necessidade,
porém, já foi reconhecida no passado, e as diferentes soluções
encontradas merecem ser consideradas nos debates atuais. Um dos
exemplos principais desses intuitos foi aquele representado por
certos arquitetos de orientação cubista do período anterior à
Primeira Guerra, em especial Pavel Janák.
Como seria possível intensificar esse diálogo em metrópoles atuais,
onde edifícios que representam as mais diversificadas orientações
estéticas do passado se confrontam com construções meramente funcionais
e economicamente ou improvisadamente prosaicas? O movimento cubista
de Praga, que projetou internacionalmente a arquitetura tcheca,
possibilita uma introdução a esse debate. Também em Praga os arquitetos
e urbanistas se confrontavam com situações urbanas dificilmente
conciliáveis: uma substância construtiva e urbanística marcada
sobretudo por edifícios góticos e pela encenação barroca de cunho
doutrinário e propagandístico da re-catolização, via-se confrontada
com novas propostas advindas de Viena e que seguiam tendências
doutrinárias de OttoWagner, segundo a qual os principais critérios
a serem observados na construção seriam racionalidade e utilidade
de acordo com o uso previsto. Representante dessas tendências
foi sobretudo Jan Kotera, cujos edifícios apresentam uma afirmação
da tectônica, uma redução da ornamentação decorativa da fachada
e a sinceridade na mostra do material utilizado. Perante a quase
que incompatibilidade de uma "Nova objetividade" com relação ao
universo gótico-barroco da cidade, procurou-se uma solução que
coadunasse a linguagem contemporânea com esse sentido tcheco por
formas dinâmicamente imbuídas de movimento e de sentido de transformação
da matéria.
A preocupação por uma dinamização da matéria marcou o Cubismo
tcheco. Para isso, passou-se a valorizar não apenas a dimensão
da transversalidade no seu sentido exteriormente geométrico. O
sistema ortogonal, tradicionalmente composto por apoios e pesos,
deveria ser superado através do uso de uma força transversal.
A transversalidade foi sentida na acepção mais ampla como um complexo
dinâmico de forças que, atuando sobre a matéria a partir do mundo
exterior, a penetraria e seria percebida pelo arquiteto. A sua
Poética, na criação de significados, levaria à formação de um
corpo arquitetônico no qual o espaço interior e a parte externa
do edifício passariam a constituir um complexo dinâmico em entrosamento
de espaço e matéria. Dada a preferência por formas poligonais,
a construção, como forma pura, geométrica, surgia como uma espécie
de cristal. Do ponto de vista urbanístico, essas concepções podem
ser percebidas no projeto para o Vysehrad de Praga (1914/15) de
Vlastislav Hofman. Nesse caso, procurou-se uma solução sensível
para a idéia de transformação arquitetônica do terreno da antiga
fortaleza de Praga, que deveria ser transformada em bairros de
moradia, um plano de questionáveis conseqüências. A proposta incluiu
não apenas uma cidade-jardim com casas seriadas mas também escadarias
monumentais que, no seu dinamismo, permitira uma coadnuação das
novas construções com a estrutura urbana histórica da cidade.
Essas tendências no pensamento arquitetônico e urbanístico tcheco
surgiam como uma crítica aos princípios modernistas de Otto Wagner
e de seus seguidores, sobretudo Jan Koteras, uma vez que esses
se apresentavam como sendo excessivamente racionalistas, materialistas
e fundamentados políticamente em orientações socialistas e trabalhistas.
Os seus protagonistas, pelo contrário, ocupando-se com obras de
teóricos alemães tais como Wilhelm Worringer ou Alois Riegl sentiam-se
antes fascinados pela idéia de uma força criadora do artista capaz
de superar os limites do material e das possibilidades estruturais.
Daí um certo relacionamento com o Gótico ou com o Barroco.
Antonio Alexandre Bispo